Aqui do alto eu vejo tudo. Este é o meu território, eu sou o Dominante, eu controlo tudo o que acontece.
Às vezes ela entra aqui também. Ela é a Inimiga.
Sua principal função é escravizar e retirar a vontade própria dos meus semelhantes. É triste ver as barbaridades das quais ela é capaz; até hoje desconheço o motivo pelo qual ela me manteve vivo enquanto os outros estão neste... neste estado terrível! Olho ao meu lado e vejo um companheiro caído: desde que eu cheguei aqui há alguns meses ele não se move, não fala, não se alimenta... Está morto por dentro. Ela fez algo a eles! Ela, a Inimiga, é horrenda!
Mas eu não me deixo abater, sou invencível em minha luta silênciosa. Diferente dos tantos outros que se enfileram nesta estante, eu ainda tenho minha vontade própria, ainda tenho o meu ódio fulminante.
Ela chega todo dia e fala. A Inimiga.
Em um gesto de fraqueza característico da raça humana ela conta em voz alta, assim todos podemos escutar, os seus segredos íntimos. Imagino que seja por isso que ela mantém os da minha raça escravizados e sem vontade: ela os usa de receptores para suas fofoquinhas. Passa o dia inteiro contando sobre as suas bobagenzinhas. Namoricos, professores, amigas, toda essa bobagem que a Inimiga considera interessante. Ah, como o meu ódio é tremendo!
Isso será o meu trunfo: sabendo de seus segredos e da sua rotina eu tenho a vantagem. Já esbocei inúmeros planos para escapar. Daqui do alto da estante tenho todo o tempo do mundo para planejar. Uma vez eu quase consegui: esperei todos saírem do Covil e rumei até a janela. Ia pular para baixo e me salvar, mas antes que pudesse escapar a Outra me capturou. Morrendo de medo eu só pude ficar parado e sorrir aquele sorrisinho bobo que uso de disfarce. A Outra é cúmplice da Inimiga. Já as vi cooperando inúmeras vezes, determinadas a me manterem preso aqui. A Outra é a encarregada da Tortura Aquática, portanto imagino que ela seja de algum modo subordinada à Inimiga. Quantas vezes eu não demonstrei caráter e força de vontade ao resistir bravamente à Tortura Aquática? Me orgulho de dizer que não trai nenhum dos meus companheiros, mesmo quando eu girava e girava sem parar naquele inferno molhado.
Mas não pensem que perdi as esperanças de escapar. Tenho ainda trunfos na manga. Já vi a Inimiga brigando sem parar com a Outra e gritando "Eu te odeio!" e jogando objetos em sua direção (especialmente alguns dos inanimados da minha raça). Posso usar isso a meu favor! Posso usar tudo ao meu favor!
Inclusive sei de todos os segredos, já que a raça humana deve pensar que nós somos... sei lá, surdos? Odeio quando as companheiras e amigas-de-torura da Inimiga vêem até o Covil e ficam nos abraçando e beijando os da minha raça, mas sei como usar isso a meu favor. Sei como usar o meu sorrisinho bobo e as minhas delicadas orelhas de pelúcia. Um dia vou escapar e, baseados em meu relatório, os da minha raça vão dominar os malditos humanos. Quando esse dia chegar, serei eu a dar apelidos degradantes à Inimiga e enfiando a Outra na Máquina Aquática infernal.
Mal posso esperar...
quinta-feira, setembro 28, 2006
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Um comentário:
HAUHAUHAUHAUHAU
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