domingo, maio 24, 2009

Espada Afiada

Mustasím conseguiu tudo destruíndo todos.
Disse que iria embora e se tornaria um almirante turco. Seus amigos não acreditaram, nem mesmo depois que ele fugiu de casa e desapareceu sem noticias. Quando voltou, dez anos depois, tinha a pele morena, três esposas, cinqüenta navios sob seu comando e uma vingança ainda insaciada.
Para satisfazer sua vontade, quis destruir todos que o conheceram
No desfile de vitória, exigiu que determinados prisioneiros especialmente escolhidos tivessem uma visão privilegiada. Queria ver em seus rostos o terror quando percebessem que era Mustasím que voltara. Queria vê-los se contorcerem quando exibisse as relíquias e tesouros que recolhera em suas conquistas. Queria vê-los vexados de humilhação quando recitasse os maiores tratados filosóficos de seu tempo. Queria que sofressem por nunca terem acreditado em sua grandeza, por terem sempre chamado-o de imbecil.
Crucificados no final da grande avenida, os prisioneiros choraram de dor durante todo o desfile de Mustasím, que lentamente se aproximava deles. O vitorioso almirante turco sorriu e levantou um mapa astral de modo que os seus antigos amigos pudessem ver os desenhos das estrelas.
- Esta é a prova de minha grandeza. Este é o sinal que o universo pôs em mim, tornando-me único. Eu não sou como vocês, eu sou grande!
Ao final do desfile, todas as conquistas de Mustasím se alinharam às suas costas, todos de frente ao triste grupo de crucificados, muitos dos quais já pediam perdão e se humilhavam de forma terrível.
Ninguém podia suportar a visão do que Mustasím era agora, que comportava muito mais que um simples homem. Mustasím parecia gigantesco em seu desfile!
As três belas esposas, todas tão bonitas que um olhar seria capaz de levar o mais calmo dos homens à loucura. Os marinheiros, infinitos como as gotas do oceano onde lutavam todos os dias, que obedeciam cada comando de seu almirante. No final da avenida, era possível enxergar também os cinquenta navios da armada invencível que aliava a mais moderna tecnologia ao espírito de destruição. As bibliotecas, as jóias, as armas afiadas, os carros de batalha, os cavalos orientais, as fênixes fulgurosas, os pomes de ouro, as gemas oceânicas, o cálamo infinito, o cadinho da transmutação, a capa da invisibilidade, os infinitos mapas, os sábios, os escravos, os astrônomos, os mitologistas, os espiões, os pintores.
Viam porque não podiam desviar o olhar do magnífico. Viam tudo, sem desviar os olhos. Pareciam enlouquecidos.
Mustasím sorria diante do estado destroçado de seus antigos amigos e parentes. Porque não puderam se compadecer dele antes?
No centro estava seu antigo companheiro, seu melhor amigo. Ele não parecia sofrer, pelo contrário, estava se divertindo com o espetáculo.
Mustasím ordenou que firmassem as cordas, que elas ferissem mais sua carne. Foi atendido prontamente, como sempre.
Seu antigo amigo cuspiu sangue e sorriu. Olhou para Mustasím e falou:
- Muito impressionantes todos os seus brinquedos. Pena que você continua a ser um imbecil.

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