Neyleen apoiou-se no galho maior e alçou-se para cima com a ajuda da pequena Fon.
- Cuidado, por favor; ela pediu. Sua voz era um suspiro no meio da mata.
Colocou as mãos juntas para cima e iniciou a escalada. Os pés seguiram e a elevaram novamente. Aos poucos Neyleen passava de galho em galho até a figura de Fon diminuir lá embaixo e eventualmente ficar escondida pela folhagem.
A árvore rangia e estalava a intervalos curtos. Tudo foi se silenciando e ecoando dentro dela enquanto subia. Como quando cantava, uma paz serena a invadiu e a fez ouvir algo que estava além. Os sons do mundo se abriram para um mistéria diferente que agora Neyleen escutava; era algo puro e intocado da floresta.
Subiu até ficar emaranhada por várias folhas e ramos das árvores menores. Com alguns gestos específicos percebeu que podia mover os galhos para passar. Pedia licença às árvores, no caso de algum espírito estar morando ali. Assim que passava as ramagens se fechavam de novo e bloqueavam o caminho da descida.
Neyleen percebeu que estava exausta. Subir nos galhos a cansara mais do que havia esperado. Sentou-se apoiada no grande tronco e fechou os olhos para prestar atenção aos ruídos que lhe chegavam.
Um tordo cantava ali perto. De outro galho vinha o martelar de um pica-pau. O som do vento nas folhas era diferente ali em cima, mais musical. Sua respiração apressada contrastava com o som sereno da floresta. Neyleen respirou mais devagar, como havia aprendido com Fon, do mesmo modo que fazia para cantar. Escutou os sons que o grosso tronco escondia em sua interior. Ouviu o seu ranger conversando com o vento e o som de algo fluindo em seu interior.
Ela ouviu um esquilo se aproximando antes que ele a visse; o pequeno animal assustou-se com a intrusa e fugiu correndo até outra árvore. De lá, ele espiou-a com interesse brilhando nos olhos.
Neyleen dicidiu continuar a subida. Levantou-se com cuidado e agarrou o galho acima. Percebeu que a claridade aumentava enquanto seguia, e que o vento ali também era forte. Como acabara de chover, toda a floresta se carregava de uma neblina fresca, uma transpiração vegetal que a envolvia carinhosamente. Aquela, ela pensou, era a respiração da mata, era a sua vida se elevando para o céu.
No próximo galho quase caiu. Recriminou-se por estar tão distraída e prometeu que não cairia e que voltaria para Fon lá embaixo. Começou a demorar-se mais, olhando bem por onde pisava.
Com sede e cansada, ela voltou a subir, ouvindo a algazarra de várias maritacas. Quando a viram, voaram todas juntas até a árvore vizinha, rindo alegremente. A neblina estava se desgrudando lenta das árvores molhadas pela chuva. Neyleen achou de uma indescritível beleza ver a transpiração das árvores voando lenta em um rio branco de nuvem. As maritacas cantavam barulhentas ao seu redor.
Os galhos iam se afinando, tornando tudo mais difícil. As copas das outras árvores se espreguiçavam ao sol, contentes. Toda a floresta parecia mais contente, exalando uma sensação de vida exuberante e preguiçosa, como se esticasse devagar os braços para alcançar o horizonte.
Neyleen via muitas aves voando ao seu redor e imaginava a quantidade de criaturas caminhando lá embaixo, sob as folhas. A árvore chegava ao seu fim mas a escolhida continuava a subir compenetrada.
Quando os galhos ficaram finos demais para continuar, ela percebeu o quanto havia subido. Estava agora no topo da árvore e tinha uma visão perfeita de toda a floresta.
Sentou-se no galho e se sentiu perfeitamente confortável.
Podia ver Neru lá de cima, um grande mar verde, vivo e denso. A neblina escapava das copas arborizadas e voava com as aves. Tudo era tão bonito ali. Tudo estava vivo e cantando respirando junto à ela.
Neyleen espiou a serra erguendo-se, os baixios escuros, os grandes olmos, o ondular parado do mundo. Neru, a grande floresta, se estendia para todos os lados. Neru, a grande mata selvagem, parecia infinita, como se constantemente estendendo seus ramos inexoráveis para engolir o mundo e deitar-se sobre ele. Sentada no galho, Neyleen se perguntou se algum dia conseguiria sair dali, do mar verde, verde que se alongava.
Balançou com o vento enquanto via a neblina branca cantar as árvores uma canção viva. Sentiu-se mais feliz do que nunca ao tentar escutar a canção que emanava da floresta.
sexta-feira, janeiro 05, 2007
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