quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Os sonhos de Clara Mellock - O Palácio Oceânico

Rebena Te Ra

Estava conversando quando o vi pela primeira vez. Parei de escutar as vozes na sala para assitir à luz que piscava no céu.
Meu corpo ficou leve e flutuou para cima, na sua direção. A enorme estrutura ia crescendo e crescendo de tamanho, revelando construções metálicas e lisas: era perfeito: a maior e a mais terrível criação da Humanidade, moldada a partir do vazio e das intenções.
Seu interior era repleto de salas, colunas, pátios e máquinas orgânicas complicadas e moventes. Monstros habitavam seu interior: eram parte de toda a super-estrutura que compunha o Palácio Oceânico. Os desejos e sonhos dos homens eram usados ali: sua força era revertida e fazia a máquina andar pelo céu. Os pesadelos e medos também: todos tinham uma sala no Palácio, todos eram energia captada pelas forças que operavam em seus mecanismos. Eram forças antigas, da época da criação do mundo, sendo controladas pela novidade que os homens impunham.
Depois que os antigos abriram as portas para os outros mundos, seu poder chegou ao limite. A barreira final, o limiar do Poder Total era precisamente o Palácio Oceânico, a maior das ambições finalmente construída. Na sala mais interior, onde piscavam mais luzes perfeitas e complexas, ficava a maior das invenções: a gigantesca Máquina Coração, feita de uma vibrante pedra vermelha que catalizava sonhos humanos, capaz de alterar a realidade através de intenções. Mnéias me disse que já a vira uma dia: era o centro e a razão de toda aquele Palácio existir nos céus e de todas as construções ao seu redor.
A própria Mnéias tinha uma posição especial dentro do Palácio Oceânico. Ela era a mente humana que fora capturada e subjugada por aqueles homens de uma era esquecida; dentro da estrutura final - como diziam os construtores - todas as facetas do homem eram conhecidas e exploradas, captadas em sua essência e usadas como parte da máquina-mundo-estrutura. Os sonhos desfilavam por caminhos escondidos, a sede de poder habitava um salão imperial revestido de pólvora, os titãs trabalhavam acorrentados nos porões, junto às mulitdões de escravos que eram obrigadas a servir o Palácio.
Mnéias me falou em sonho do horror e da crueldade que os antigos praticavam entre si: aqueles que não eram hábeis em magia ou cheios de conhecimentos era prontamente despachados para os níveis inferiores para trabalharem nas estruturas pesadas e perfeitas. Somente os mais poderosos ocupavam cadeiras no alto do panteão central - eram cinco reis-deuses que conduziam a máquina -, enquanto que milhares de homens e mulheres alimentavam o Palácio de medos, angústias e derrota - sendo, por sua vez, alimento dos monstros e temores que habitavam os corredores maquinares.
Era uma quantidade gigantesca de escravos, me dizia a mariposa Mnéias. Eram mais homens sofrendo nas estruturas do que as pessoas que existem hoje no mundo. Hoje? Que mundo? O Palácio Oceânico comeu o tempo, devorou o espaço e alçou-se ao céu dos anjos. Os homens haviam criado o Poder, criado uma máquina-orgânica feita de vazio e força, criado a Estrutura Final, construído um Anjo! Acabou-se aí a Humanidade, quando todos subiram a bordo, até o céu, até o fim. Superaram a última barreira e ganharam todo o poder do pensamento, do corpo e do espírito. Eram deuses em sua magnífica carruagem tão terrível! A Última criação dos antigos, que despertou a ira dos verdadeiros deuses e desencadeou o Cataclisma pela sua instabilidade no mundo. Logo que o Palácio Oceânico subiu em sua luz impessoal, fogo e água varreram a terra, destruindo o que havia sido criado até então e mudando os continentes.
No centro deste anjo terrível morava a Máquina Coração, feita da miraculosa pedra vermelha, que tantos anos atrás permitira o surgimento do ser humano. Pois então, porque não pegar carona no eterno Palácio e viajar até muito antes? Até o mundo em sua forma primitiva e sem definição, morada de seres e criaturas sem nome algum.
Um dia vemos alguns seres muito pequenos e muito fracos se escondendo em alguma floresta. São tão assustados que fogem ao ver a pedra que cai do espaço. Sonhei com os homens voltando - era a curiosidade agindo - e pegando uma pedra vinda dos céus, uma pedra tão vermelha e tão bonita!, e começando a inventar. Uma coisa diferente se deu aos homens quando tocaram a pedra: eles podiam pensar em coisas que não estavam ali, e durante a noite tinham visões enquanto dormiam. Um homem pensava em coisas que nem sequer existiam e outro inventava coisas que podiam ser. Agora Mnéias e eu vemos surgir a Humanidade a partir da Pedra dos Sonhos que logo seria usada para se conhecer a magia e - tentando fazer com que a magia não se perdesse - para a criação de palavras. Uma espada muito poderosa seria feita desta pedra. Um anel capaz de prender os monstros seria engastado com seu fragmento e seus restos remanescentes iriam construir a Máquina Coração, capaz de transformar sonhos em realidade usando apenas a intenção, formando o que era o cerne do Palácio Oceânico. Vemos agora o fim do homem, o Cataclisma, os escravos morrerem aos punhados, os sonhos escorregarem das estruturas perfeitas e cairem no mundo, os pesadelos voarem livres de suas correntes. O passado foi apagado, o Palácio Oceânico foi arrasado. Nunca mais os homens poderiam construir outro Anjo.
E como os deuses e os outros anjos puderam destruir algo eterno? Talvez o Palácio não tenha resistido a si próprio e fragmentou-se. O que havia com o desejos daqueles cinco homens que sentavam-se nas cadeiras ao lado da Máquina Coração? Como puderam destruir tanto? Foi uma Era que se acabou, um mundo que ruiu. Começaríamos tudo de novo? Um nome... - Schala - , sussurra Mnéias, nos implora através dos séculos para que nunca mais tentemos construir uma estrutura tão perfeita. E quem vai se lembrar do que não existe mais? Os anjos apagaram "Të'r;a., mesmo do passado. O nome do Palácio Oceânico não pode mais ser pronunciado por minha boca.
E porque os sonhos me mostram isso? Não quero mais sentir o horror ou ver as imagens pulsantes das luzes nas estruturas perfeitas, então deixem-me voltar a dormir, que não quero mais conhecer "Të'r;a., , o Palácio Oceânico.

2 comentários:

Charles Bosworth disse...

P.S. - Nada a ver com Terra, o planeta em que vivemos. Tentem não conseguir ler, ou falar apenas "Te Ra".

Charles Bosworth disse...

P.P.S. - Sim, Chrono Trigger...