Mal Rufus e Lancelot chegaram à cidade de Pisa já pressentiram que havia algo de errado.
- São as galinhas... - confidenciou uma velha senhora - Toda noite uma galinha desaparece e ninguém sabe quem foi, como foi ou quem será o próximo. O prefeito está oferecendo uma generosa recompensa para quem descobrir o ladrão.
Os dois viajantes resolveram aceitar o desafio.
De noite, ficaram acordados diante do paiol onde todo o povo da cidade havia reunido as galinhas. Se elas ficassem juntas, eles pensaram, poderiam ser defendidas mais facilmente e, o que era melhor, comunitáriamente. Rufus mal teve tempo de terminar três fantoches de galinhas, aos quais amarrou firmes fios quase invisíveis no escuro da noite. Seguindo as instruções de Lancelot, ele deixou os três fantoches na beira da janela, como se dormissem.
- Agora só nos resta esperar de olhos bem abertos...
A noite já ia alta quando uma sombra pulou o muro da cidade. Ela rastejou pelas ruas e chegou diante do paiol, tendo adormecido um a um os guardas no caminho. Lancelot e Rufus, como eram estrangeiros e estavam bem escondidos, não foram percebidos.
Tratava-se da bruxa do leste, que toda noite punha um feitiço de sono nas pessoas da cidade e lhes roubava as galinhas para comer. Mas assim que ela pôs as mãos sobre as galinhas, Rufus puxou as cordas e fez os animais voarem.
- O que é isso? - gritou a bruxa - Vocês não deveriam estar se mexendo tanto assim. Fiquem paradas!
Rufus fez os bonecos correrem para fora do paiol e os deixou sentados no topo de uma cerca, como uma galinha normal faria, enquanto vestia o longo casaco de pena de ganso e se apresentava diante da bruxa.
- Parada feiticeira! - ele ordenou.
- Quem está aí? - a bruxa guinchou assustada - Não deveria haver ninguém acordado na cidade inteira!
E, seguindo o que Lancelot lhe sugeria de dentro do longo casaco, o filho mais novo do moleiro declamou:
- Pois saiba que eu sou um poderoso feiticeiro. E que, portanto, sou imune às suas magias baratas.
- Mais poderoso que eu, a bruxa do leste? Impossível.
- Ora, mas sou cem vezes mais habilidoso que a senhora. Por isso venho clamar esta cidade como meu território e acho bom nunca te ver pisar aqui de novo.
E a bruxa, que não queria perder suas fáceis refeições de galinha:
- Não acredito. Se você é um mago tão poderoso, que tal provar? Eu proponho um duelo de magias!
Dentro de seu esconderijo, Lancelot sorriu.
Os dois se encararam na rua principal de Pisa. Um de cada lado, de frente para o grande paiol onde as galinhas eram guardadas.
- Que tal se eu começar demonstrando minha habilidade, poderoso feiticeiro? - disse a bruxa irônica.
- Vá em frente, vá em frente - suspirou Rufus, cofiando uma barba inexistente.
- Para começar, um feitiço de fazer crescer o mato e as ervas daninhas em um jardim! - Dito isso, começaram a nascer, em um quintal próximo, incontáveis arbustos retorcidos, pequenos matos inconvenientes e ervas desagradáveis.
- Muito interessante. Mas você pode fazer nascer um gato de dentro do seu casaco? - e, dizendo isso, Rufus retirou Lancelot de dentro de seu casaco mágico de pena de ganso onde ele estava escondido.
- Impossível - bradou a bruxa - Você está trapaceando. Você tinha guardado esse gato aí esse tempo todo!
- Então quer me ver fazer de novo? - perguntou Rufus, desta vez retirando o boneco de Lancelot que ele construíra, colocando-o no chão de modo que parecia-se muito com um gato preto de verdade.
- Que tal este encantamento então - disse a bruxa. E quando ela estalou seus dedos, uma horrível verruga nasceu bem no nariz do jovem filho do moleiro. Ela estalou de novo e nasceu mais uma. Mais uma vez e Rufus já podia voltar para casa com três verrugas.
- Truques velhos para um velho feiticeiro como eu - ele suspirou, fingindo tranqüilidade - Que tal isto então? - E pulou por sobre um fio de varal em um quintal próximo - Posso invocar os poderes do vento e caminhar até em um fio de cabelo!
A bruxa parecia assustadíssima, mas não se rendeu.
Ela puxou uma espiga de milho da saia e começou a debulhar cantando uma cantiga maléfica. De dentro de uma das casas soou um grito terrível.
- Faço-os terem pesadelos enquanto dormem. Sonhar com o diabo ou com um cavalo desgovernado. É uma delícia escutá-los gritar!
Rufus se assustou ainda mais. Este era o grande feitiço da bruxa. Ele teria que se esforçar para ganhar desta vez.
- Acredito que você tem encantamentos nem um pouco desprezíveis. Porém, como sou o feiticeiro mais poderoso esta cidade deve pertencer a mim. Você deverá abdicar de seu roubo de galinhas e deixar meus cidadãos em paz.
- E por que eu faria isso? - a bruxa riu.
- Por causa do meu feitiço mais poderoso, que me dá controle sobre a vida alheia. Não quero assustá-la, por isso experimentarei naquelas galinhas - E, dizendo isso, Rufus puxou as cordas que ainda prendiam os fantoches de galinhas pousados sobre a cerca, fazendo-as pularem - Agora, andem! Em fila - e, movimentando as cordas invisíveis de acordo, fez as falsas galinhas caminharem em fila.
- Pulem! - ele ordenava. E elas pulavam.
- Não pode ser, não pode ser! - a bruxa do leste gritou - Nem eu nem nenhuma de minhas irmãs temos estes poderes! Mas não me dou por vencida. Demonstramos um número igual de feitiços e encantamentos, não vejo porque deveria deixar esta cidade com você.
- Então observe - sorriu Rufus, apontando para Lancelot, que assistia tudo ali do lado - Fale! - ele ordenou e:
- Minha senhora, eu creio que você deveria escutar o conselho de meu mestre, o poderoso feiticeiro - disse Lancelot, muito educadamente, retirando seu chapéu, fazendo com que a velha bruxa gritasse de susto.
- Agora vá! - Rufus gritou - E não volte mais aqui, ou irei te enfeitiçar de um modo terrível.
Assim que a bruxa foi embora correndo pela estrada as ervas daninhas morreram e as verrugas sumiram.
No dia seguinte, Rufus e Lancelot receberam uma generosa recompensa do prefeito. Felizes de terem libertado Pisa do domínio da bruxa, eles continuaram sua jornada, cada vez mais perto de Florença...
terça-feira, dezembro 09, 2008
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Um comentário:
Acho que esta possivelmente foi a melhor história até agora :þ
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